Como a Terapia Focada na Compaixão Pode Ajudar no Tratamento do TOC de Limpeza

Terapia Focada na Compaixão (CFT) no Tratamento do TOC.
Entendendo o TOC à luz da CFT:
O TOC é caracterizado por obsessões (pensamentos, imagens ou impulsos intrusivos, indesejados e angustiantes) e compulsões (comportamentos repetitivos ou atos mentais realizados para neutralizar a ansiedade).
Na CFT, compreende-se que o sistema de ameaça do cérebro está hiperativado no TOC, levando a uma tentativa desesperada de restaurar a segurança por meio de compulsões. Além disso, pessoas com TOC frequentemente convivem com intensa autocrítica, vergonha, medo de causar dano ou de serem moralmente más, o que agrava ainda mais o sofrimento.
A CFT propõe um caminho de tratamento baseado em:
? Reduzir a fusão com os pensamentos intrusivos por meio de uma postura compassiva;
? Diminuir o medo moral e a vergonha através do acolhimento compassivo das emoções;
? Cultivar um senso interno de segurança, coragem e cuidado que substitui os ciclos de controle compulsivo.
Foco terapêutico da CFT para o TOC.
Objetivos principais:
1. Regulação do sistema de ameaça por meio da ativação do sistema de afiliação (calma e cuidado);
2. Redução da vergonha e da autocrítica moral (muito presentes em TOCs como TOC religioso, TOC de dano ou de pureza);
3. Criação de um Eu Compassivo que possa responder às obsessões com sabedoria e coragem;
4. Treinamento da mente para acolher pensamentos intrusivos sem fusão ou julgamento.
Para dar um exemplo escolhi o Toc de limpeza, então selecionei alguns exercícios da Terapia Focada na Compaixão (CFT) aplicados especificamente ao TOC de limpeza, que envolve obsessões relacionadas à contaminação e compulsões de lavar, evitar ou higienizar excessivamente.
Terapia Focada na Compaixão para TOC de Limpeza: Exercícios Detalhados.
O TOC de limpeza geralmente está associado ao medo de causar dano (a si ou aos outros), de ser impuro, de se contaminar ou transmitir doenças. Esse tipo de TOC é intensamente alimentado pela vergonha, nojo e autocrítica, frequentemente com pensamentos como:
? "Se eu tocar nisso, posso pegar uma doença ou fazer mal a alguém."
? "Sou nojento, impuro."
? "Sou uma ameaça se não me higienizar corretamente."
A CFT ajuda o paciente a desligar o ciclo entre medo ? compulsão ? alívio ? reforço ao oferecer uma nova forma de se relacionar com essas ameaças internas: com coragem, segurança interna e compaixão.
1. Respiração Compassiva Aplicada ao Medo de Contaminação
Situação: paciente tocou algo que considera sujo (ex: maçaneta de porta pública) e sente a urgência de lavar as mãos.
Prática guiada (3-5 minutos):
1. Pausa: "Antes de correr para lavar, vamos fazer uma pausa."
2. Respiração: inspire por 4 segundos, expire por 6 segundos, com um leve sorriso interno.
3. Acolhimento do medo:
"Essa sensação de ameaça está aqui para me proteger. Eu vejo você, medo. Posso ficar com você por alguns minutos."
4. Evocação do Eu Compassivo:
"Minha intenção é cuidar de mim, não me punir. Posso enfrentar isso com coragem."
Objetivo: desenvolver tolerância emocional à ansiedade sem ceder ao ritual.
2. Diálogo Compassivo com o Pensamento Obsessivo:
Pensamento obsessivo típico: "Se eu não lavar agora, posso adoecer e morrer, ou contaminar minha família."
Intervenção CFT:
1. Nomear o pensamento: "Esse é o meu pensamento de ameaça número 1."
2. Evocar o Eu Compassivo:
"Pensamento, sei que você está tentando me manter seguro. Mas hoje eu vou te ouvir com gentileza, não com obediência cega."
"Eu não sou uma ameaça só porque minhas mãos tocaram algo público. Eu sou alguém em processo de cura."
3. Imaginar o Eu Compassivo falando com a parte assustada:
"Pequena parte de mim que está com medo, estou aqui com você. Estamos seguros agora. Você não está sozinho."
3. Carta Compassiva ao Eu Contaminado
Objetivo: aliviar a vergonha e a sensação de impureza, ressignificando o impulso compulsivo como uma tentativa de cuidado distorcido.
Instruções:
? Peça ao paciente que escreva uma carta como se estivesse consolando uma criança que acha que está "suja" ou "perigosa".
Exemplo:
Querido eu,
Você se sente contaminado porque quer proteger quem ama. Isso mostra o quanto você se importa. Mas seu valor não depende de estar "limpo" o tempo todo. Seu toque não é perigoso. Sua presença é segura. Você merece descanso, carinho e aceitação.
Resultado clínico: redução da culpa, diminuição do perfeccionismo moral e aumento da aceitação do desconforto.
4. Imaginação Compassiva do Eu Limpo e Seguro.
Objetivo: substituir a imagem interna de "sujeira/perigo" por uma imagem de dignidade e segurança compassiva.
Guia imagético:
1. Feche os olhos e imagine seu Eu Compassivo te olhando com aceitação, mesmo que você esteja com as mãos "não lavadas".
2. Visualize esse Eu dizendo:
"Você é limpo mesmo quando sente que não está. Você é digno mesmo com essa sensação de desconforto. Você é mais que sua compulsão."
3. Sinta como é estar ao lado dessa presença. Acolha o desconforto sem julgamento.
Nota clínica: essa prática ativa o sistema de afiliação e regula a sensação de ameaça moral.
5. Exposição com suporte compassivo (integração com EPR)
Exemplo clínico: tocar a pia de um banheiro público e não lavar as mãos por 5 minutos.
Antes da exposição:
? Fazer respiração compassiva.
? Repetir frases como:
"Estou treinando meu cérebro para viver com mais liberdade. É seguro sentir desconforto."
Durante a exposição:
? Nomear a ansiedade: "Meu cérebro está em alerta. Mas eu não estou realmente em perigo."
? Usar o Eu Compassivo internamente como "escudo emocional".

Após a exposição:
? Validar a conquista:
"Você foi corajoso. Você enfrentou o medo com dignidade. Isso é cura."

Considerações Finais:
O TOC de limpeza está frequentemente associado a crenças profundas de que o indivíduo é ou pode se tornar perigoso, sujo, danoso, e que lavar é uma forma de "limpar" não apenas o corpo, mas a culpa e a vergonha.
A Terapia Focada na Compaixão trabalha justamente para mostrar ao paciente que ele não precisa se punir para ser bom. Ele pode acolher seus medos com coragem, e aprender a viver mesmo com a presença da incerteza, sem deixar que ela controle sua vida.
Clystine Abram